sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Ser pacifista exige coragem Mel Frykberg


Jerusalém, Israel, 22/10/2010, (IPS) - O ex-capitão da Força Aérea Israelense Yonatan Shapira, outrora fervoroso sionista que perdeu vários familiares no Holocausto, hoje é tachado de psicopata e criticado por muitos compatriotas devido à sua oposição à ocupação dos territórios palestinos. Yonatan, de 38 anos, foi demitido de seu trabalho, insultado em público e até ameaçado de morte na seção de cartas do leitores nos jornais. Foi chamado de traidor, acusado de agredir oficiais das forças de segurança e foi interrogado por funcionários da agência de inteligência interna, a Shabak.

Israel costuma ser muito criticado pelo tratamento cruel contra os palestinos e pelo racismo inerente de sua sociedade, mas existe um crescente grupo de cidadãos que paga um alto preço por defender os direitos humanos e criticar a política do governo. Yonatan ocupou as primeiras páginas de vários jornais internacionais por integrar a tripulação do Irene, barco da organização Judeus pela Justiça que tentou, em setembro, romper o bloqueio contra o território palestino de Gaza e foi interceptado por comandos israelenses.

Havia numerosos israelenses e vários sobreviventes do Holocausto no barco. “Os oficiais separaram meu irmão mais novo, Itimar, e eu do resto dos passageiros. Era óbvio que procuravam por mim. Me aplicaram choques elétricos no ombro e um perto do coração, após terem tirado meu colete salva-vidas para facilitar a tortura”, disse Yonatan à IPS. Depois de confiscarem os equipamentos de filmagem, os passageiros foram levados a uma delegacia de Ashdod para interrogatório. Yonatan foi acusado de atacar um oficial, embora testemunhas neguem essa versão. Foi a segunda vez que o acusaram do mesmo ato.

No começo deste ano foi agredido por soldados israelenses durante um protesto contra o confisco de terras na aldeia palestina de Nabi Saleh, perto da cidade de Ramalá, na Cisjordânia. As imagens de vídeo provam que não foi assim. O que mais enraiveceu a segurança de Israel foi o que se conhece como Carta dos Pilotos, de 2003. Na época, Yonatan era capitão da Força Aérea de Israel, que idolatra seu exército. A carta escrita por ele foi assinada por outros 30 pilotos. “Os signatários abaixo não estão dispostos a continuar fazendo parte de ataques indiscriminados contra os palestinos nos territórios ocupados. Declaramos nossa rejeição a participar do que acreditamos serem atividades ilegais e imorais”, dizia a carta.

“Ouvi muitas histórias de brutalidade e assassinatos desnecessários. Mas o que realmente levou o assunto à carta foram os comentários do então comandante Dan Haluz sobre o bombardeio indiscriminado de um edifício em um bairro densamente povoado na cidade de Gaza, em 2002”, recordou Yonatan. No atentado com bomba contra a residência de Saleh Shehade, um comandante do Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), morreram 15 pessoas, entre elas muitas crianças, e outras 150 ficaram feridas. “O que teria sentido quando o avião lançou a bomba foi um ligeiro tremor do aparelho”, respondeu Halutz ao ser consultado sobre seus sentimentos a respeito da morte de tantos civis.

Três meses depois da Carta dos Pilotos, o irmão mais velho de Yonatan, Zhoar, que pertenceu à unidade de elite Sayaret Matkal, assinou a Carta dos Comandos, que diz, mais ou menos, a mesma coisa. O irmão mais novo, Itimar, foi detido pelas forças de Defesa de Israel (FDI) por se negar a ir para a frente de batalha em 2006, na guerra contra o Líbano. “Nossa opinião mudou de forma drástica durante a segunda Intifada Palestina, que eclodiu em 2000, quando testemunhamos atos criminosos e manobras para encobri-los por parte das forças armadas. Minha mãe se tornou uma ativista política. Agora, passa muito tempo na Cisjordânia”, disse Yonatan à IPS.

A família de Yonatan se distanciou de suas raízes sionistas. “Meu pai foi comandante de esquadrão das FDI e participou das guerras de 1967 e 1982. Eu costumava lamentar não ter nascido antes para ter participado da guerra da independência em 1948”, afirmou. “Agora, creio que Israel é um Estado racista que ataca os palestinos nos territórios ocupados e discrimina os árabes israelenses. Com meus amigos, chegamos à conclusão de que a única forma de salvar este país de si mesmo é apoiando a campanha internacional Boicote, Desinvestimento e Sanções”, acrescentou Yonatan.

“O atual governo é o mais extremista e direitista que Israel já teve em toda sua história. Já não basta tentar mudá-lo de dentro. É preciso pressionar como se fez com o regime sul-africano do apartheid”, insistiu. A tendência direitista de Israel nos últimos anos se deve, segundo Yonatan, à dificuldade de apresentar-se como vítima do conflito com os palestinos, afirmou.

“foi criado sobre a base de sua condição de vítima e continuou usando essa alegação como ferramenta política diante das críticas, mas estas ganham força”, disse. O Estado judeu “tem duas opções: admitir as injustiças cometidas contra os palestinos e assumir sua responsabilidade ou continuar fazendo o papel de vítima e consolidar seu comportamento racista”, ressaltou Yonatan. Envolverde/IPS (FIN/2010) 

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