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segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A presença judaica no Brasil - 03

HERANÇA
A pequena Venha-Ver, fundada em 1811 por cristãos-novos, guarda vestígios de sua origem judaica
Cidade no RN preserva tradição judaica
ANDRÉA DE LIMA

da Agência Folha, em Venha-Ver Uma pequena cidade perdida no interior do Rio Grande do Norte guarda vestígios da origem judaica de sua população, cujos fundadores, em 1811, eram descendentes de cristãos-novos -judeus convertidos à fé cristã.

Mesmo cristãos, os habitantes de Venha-Ver (440 km a oeste de Natal) revelam em hábitos cotidianos uma tradição particular, transmitida há séculos de geração a geração. A maioria dos habitantes, porém, não tem consciência da origem de seus ancestrais.

Os sinais mais evidentes da tradição judaica encontrados na pequena cidade pela Agência Folha são a fixação de cruzes em formato hexagonal na porta de entrada das casas, o enterro dos corpos em mortalhas brancas e os sobrenomes típicos de cristãos-novos. Os costumes de retirar totalmente o sangue da carne animal após o abate e de colocar seixos sobre os túmulos também podem ser relacionados à ascendência judaica dos habitantes.

Os judeus colocam seixos sobre as sepulturas com o significado de que o morto não será esquecido. Em Venha-Ver, pôr um seixo sobre o túmulo significa uma oração à pessoa ali enterrada. O próprio nome da cidade é uma provável fusão da palavra "vem" (do verbo vir, em português) com o termo hebraico "chaver" (pronuncia-se ráver), que significa amigo, companheiro. Ou seja, Venha-Ver seria uma corruptela de "Vem, Chaver".

Esses foram parte dos indícios relatados pelo rabino Jacques Cukierkorn em sua tese de rabinato (equivalente a mestrado) sobre a ascendência judaica entre a população do Rio Grande do Norte.
A preservação de tradições centenárias entre a comunidade de Venha-Ver foi facilitada pelo isolamento do município, situado no extremo oeste do Rio Grande do Norte, nas fronteiras com Ceará e Paraíba. Só se chega ali por uma sinuosa estrada de terra.

Batentes

Para o rabino Cukierkorn, as cruzes de Venha-Ver têm sua origem na mezuzá -pequena caixinha com uma reza que os judeus fixam nos batentes das portas.
Muitas delas têm formato hexagonal, como a Estrela de David, símbolo da fé judaica.
A população explica as cruzes nas portas de suas casas como uma proteção contra o mal, o demônio, a ventania e os raios. Os judeus fixam a mezuzá nos batentes para demarcar a proteção divina sobre a casa. Na pequena localidade, os cadáveres são envolvidos em mortalhas para serem conduzidos até a sepultura. É o que determina a tradição judaica.

Esse costume é explicado pelos habitantes de Venha-Ver como algo passado de pai para filho. Há um preconceito contra o uso de caixão -recentemente introduzido nos funerais locais. Cukierkorn vê, na forma de tratar a carne animal, a presença das regras da culinária "kasher" -determinadas pelo judaísmo. Logo após o abate de um animal em Venha-Ver, os pedaços de carne são dependurados com uma corda sobre um tronco de árvore, para que todo o sangue escorra.
Depois disso, a carne é salgada -prática usual entre os judeus ortodoxos.

Cristãos-novos

Os sobrenomes mais comuns da população branca de Venha-Ver (parte da comunidade, de fixação mais recente, tem origem negra) são Carvalho, Moreira, Nogueira, Oliveira e Pinheiro, notadamente de cristãos-novos, conforme estudo do professor de antropologia José Nunes Cabral de Carvalho (1913-1979), fundador da Comunidade Israelita do Rio Grande do Norte.

A repressão religiosa desencadeada pela Inquisição, particularmente nos séculos 15 e 16, fez com que uma ampla população judaica tenha sido forçada a se converter ao cristianismo em Portugal, Espanha e também no Brasil, alterando sua fé religiosa, sobrenome e comportamento social.

A presença judaica no Brasil – 02

Fonte: História: Revista da Biblioteca Nacional, Ano 5, nº58, julho, 2010.

A partir de 1497 os primeiros cristãos novos vindos da Península Ibérica chegam a Recife. O fluxo migratório aumenta na medida em que os anos passam. Em 1542, Diogo Fernandes e Pedro Álvares Madeira montam o engenho Camaragibe. Em 1591, é a vez de James Lopes da Costa e o engenho da Várzea.

Em pouco tempo os judeus foram ocupando o mercado recifense ora como mercadores, ou rendeiros na cobrança dos dízimos ou responsáveis por empréstimos. Contudo, o grande fluxo dessa imigração ocorre mesmo é no período da invasão holandesa (1630-1654). A dominação holandesa se espalhou do rio São Francisco ao Maranhão o que permitiu a penetração dos judeus em boa parte da região nordestina. Nesse período os grupos não católicos gozavam de relativa autonomia religiosa. Esse direito era assegurado a todos os credos pelo Regimento do Governo das Praças conquistadas concedido pelos Estados à Cia das Índias Ocidentais (Haia, 13 de outubro de 1629).

A partir da consolidação do sistema colonial flamengo no Nordeste brasileiro, judeus Sefarditas (Península Ibérica) e Askenazins (Polônia e Alemanha) se fixaram na região onde procuraram desenvolver seus negócios. Consta da documentação da época que a quantidade de judeus era tão expressiva que Duarte Saraiva (David Sênior Coronel) comprou um terreno para alojá-lo junto à porta de Terra, no caminho de Olinda. Foi deste empreendimento que nasceu a Rua dos judeus (Jodenstraat) e a primeira sinagoga judia da América: A Kahal kadosh Zur Israel (Santa Comunidade o Rochedo de Israel) em 1636.

Consta nos documentos da época que Isaac Aboab da Fonseca (1605-1693) foi seu primeiro rabino, bem como fundador anos posteriores da Grande Sinagoga Portuguesa em Amsterdã. O fato é que os judeus gozavam de relativa liberdade até o momento em que o Conde de Nassau deixou o Brasil. Com o retorno de Nassau aumenta a opressão holandesa sobre os brasileiros e com ela o ódio ao invasor e aos judeus amigos dos invasores. Já em 1645, temos o início da insurreição Pernambucana (Monte das Tabocas, Casa Forte, Cabo de Santo Agostinho) e notícias de inúmeras derrotas holandesas.
 
Recife é isolado e enfrenta períodos de fome até que finalmente se rende aos lusitanos (Batalhas dos Montes Guararapes - 1648-1649). 400 judeus moradores do Recife e de Maurícia (a Ilha de Antonio Vaz) voltaram para os Países Baixos. Outros permanecerão nas Américas, fundando novas colônias em ilhas do Caribe e na América do Norte.

Um destes grupos que saiu no navio Valk e fez uma primeira escala na Jamaica, onde acabou prisioneiro dos espanhóis. Depois de conseguir escapar com apoio dos franceses, rumou para nova Amsterdã a bordo do barco Sainte Catherine. Na nova terra os vinte e três adultos e crianças criam a primeira comunidade judaica de Nova York.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A presença judaica no Brasil - 01


Numa destas tarde no Mario Lira foi abordado pelo meu amigo judeu. Entre os diversos temas que debatemos um me chamou especial atenção, foi quando ele falou incisivamente:

-        Você meu caro é de ascendência judaica.

Fiquei curioso com a revelação e logo procurei saber se esta história tinha ou não lógica. Meu amigo logo esclareceu:

-        A família Medeiros, assim como qualquer outra família sertaneja que tenha sobrenome de plantas, animais são de origem judaica – e continuou - A razão para isso é clara, para fugir dos pogroms na Europa os judeus haviam se mudado para o Brasil e aqui mantiveram suas praticas religiosas. A adoção destes nomes advinha de duas hipóteses: fugir da perseguição do Santo Ofício ou mediante a adoção do seu novo nome de cristão novo.

Essas informações aguçaram minha curiosidade e passei a procurar mais informações para confirmar ou refutar o amigo. Nessa semana ao visitar a biblioteca do Instituto Padre Miguelinho me deparei com um periódico da Biblioteca Nacional (julho, 2010, nº58) que tinha como reportagem de capa: “Judeus no Brasil: terra prometida nos trópicos”.

O que passo agora para meus irmãos de perto e da distância é um apanhado do que li nesse periódico.

Esquadra de Cabral
A presença judaica no Brasil vem desde o descobrimento. Entre os registros históricos da esquadra de Cabral temos a figura de Gaspar da Gama, cristão novo de Alexandria que colaborava com o esforço expansionista lusitano. Ele destoa entre os demais membros da tripulação, contudo pode não ter sido o único judeu nessa empresa.

A parceria entre a coroa lusa e a comunidade judaica era antiga e teve inicio desde o século VI da era cristã. Em Portugal os judeus gozavam de certa autonomia que não desfrutavam em nenhum outro lugar da Europa. Nessa época era comum ocuparem cargos públicos, ter suas empresas e desfrutavam de relativa liberdade de culto e simpatia de alguns monarcas lusos. Contudo, essa situação muda drasticamente a partir do século XV-XVI, quando D. Manuel (1495-1521) expulsa oficialmente os judeus do seu reino, mas proíbe sua debandada. Na prática força os judeus a se converterem ao cristianismo. Os judeus era uma força econômica considerável para o Estado Luso, portanto, não podiam deixá-los partir (isso me lembra o cativeiro do Egito).

Essa conversão forçada ao cristianismo dar origem ao termo “Cristão Novo”. Esse conceito é usado para diferenciar os judeus convertidos dos gentios (cristãos velhos). Com a instauração do Santo Ofício em 1536, parte da comunidade Sefarditas (Península Ibérica) se espalham pela Europa, Norte da África, Angola, China, Indonésia, Japão e Brasil.

A saída dos judeus de Portugal acaba trazendo prejuízos a sua economia. Em parte porque foram eles um dos principais articuladores da expansão lusa. Neste sentido, qualificações é que não faltavam:

·         Comunicavam-se em latim, português, hebraico e idiomas de povos locais.
·         Financiaram as viagens de conquistas.
·         Contribuíram com o conhecimento técnico (construções de embarcações, uso de mapa, bússolas, etc.).

Contudo, os poderosos da época não faziam caso desta situação ou não avaliavam bem a sua extensão. O Brasil despontava como um novo paraíso para os judeus, visto que a Europa com seus pogroms inviabilizava qualquer projeto de vida. A escolha da colônia americana tinha lá seus motivos:

·         Não existia Tribunal do Santo Ofício no Brasil.
·         A colônia vivenciava um forte crescimento econômico.

Tortura inquisitorial
Uma vez no Brasil participaram da vida política e social a tal ponto que muitos judeus tornaram-se senhores de engenho e como tal influenciaram e se deixaram influenciar pela cultura colonial. Um exemplo disto era a existência de casamento entre gentios e judeus, fato este que distendeu por um bom tempo a relação nada amistosa entre as elites coloniais e os judeus brasileiros.

Nos anos 1591-1595, o Santo Ofício visitou o Brasil quebrando a harmonia conquistada à duras penas por judeus e gentios. Entre esses anos as províncias da Bahia, Pernambuco, Itamaracá e Paraíba foram visitadas pelos inquisidores que recolhiam provas contra suas prováveis vítimas. As principais pistas para se capturar um criptojudeu eram:

·         Se o indivíduo usava roupas limpas.
·         Se arrumar a casa à sexta-feira.
·         Se não pronunciar o nome de Jesus Cristo.
·         Se o indivíduo preparava comida segundo a tradição judaica.
·         Se não comia carne de porco.

Identificado o judeu deveria ser denunciado imediatamente ao Tribunal do Santo Ofício que assumiria o caso a partir deste ponto. Diante desta situação a tradição judaica ficou restrita ao ambiente familiar cabendo a mulher o papel de mãe, professora e rabi da família. Um exemplo dessa realidade está na prisão, julgamento e morte da octogenária Ana Rodrigues, judia brasileira, resistente cultural em terras lusitanas.

Continua.